Ex 3,1-18a.13-15
Sl 102
1Cor 10,1-6.10-12
Sl 102
1Cor 10,1-6.10-12
O tempo
da Quaresma recorda muitas vezes o tempo da travessia do deserto por parte de
Israel: tempo de peregrinação, de provação e de purificação. O livro do
Deuteronômio recorda isto com palavras muito fortes: “Lembra-te de todo o caminho que o Senhor teu Deus te fez
percorrer durante quarenta anos no deserto, a fim de humilhar-te, tentar-te e
conhecer o que tinhas no coração. Portanto, reconhece hoje no teu coração que o
Senhor teu Deus te educava, como um homem educa seu filho” (Dt 8,2.5).
No deserto, portanto,
Deus usou as provas pelas quais Israel passou, para revelar ao seu povo aquilo
que estava escondido no seu próprio coração, isto é, seu pecado, sua fraqueza,
sua infidelidade. Mas, também no deserto, Deus cercou seu povo de carinho e
proteção, alimentou-o com o maná e saciou-o com a água do rochedo, guiou-o pela
nuvem luminosa de noite e protetora contra o sol de dia… Tempo de noivado e de
amor entre Deus e o seu povo, foi o tempo do deserto! Por isso, pensar nessa
travessia pelo deserto serve tanto para a nossa preparação para a Páscoa.
Mas, vejamos. Como começou o caminho de Israel deserto a dentro?
Começou com a “descida” de Deus para juntinho do seu povo que gemia debaixo de
humilhante escravidão: “Eu vi a aflição do meu povo
que está no Egito e ouvi o seu clamor por causa da dureza de seus opressores.
Sim, conheço os seus sofrimentos. Desci para libertá-lo e fazê-los sair…” Que
coisa impressionante: um Deus tão grande, tão santo, o Deus de Israel e, no
entanto, é capaz de ver a aflição, ouvir o clamor, conhecer o sofrimento do seu
povo, que era ninguém, que não passava de um punhado de escravos! “Eu desci para libertá-lo!”
Nosso Deus é um
Deus que desce, que vem para junto do pobre que se encontra no monturo! Nosso
Deus é um Deus que liberta e salva! E quando Moisés pergunta pelo seu nome,
Deus revela-o de dois modos: primeiro apresenta-se como o “o Deus de teus pais, o Deus de Abraão, de Isaac e de Jacó” –
isto é, o Deus fiel, o Deus que não esqueceu seus amigos do passado, Abraão,
Isaac e Jacó e agora vem em socorro de seus descendentes. Depois, Deus revela o
seu nome: “Eu sou aquele que será”. Segundo
bons exegetas, assim deve-se traduzir o nome de Deus. Isto é, Deus não revela o
seu nome a Moisés! Seu “nome”, na verdade, é um desafio, um convite; quer
dizer: “Eu sou o que tu verás quando eu agir! Tu verás quem eu sou à medida que
caminhares comigo! Eu sou o que estará sempre contigo!” – O Deus que foi fiel a
Abraão, a Isaac e a Jacó é confiável, pode-se apostar a vida nele: Moisés e o
povo de Israel haverão de ver! E viram, em tantos momentos da travessia do
deserto.
Na segunda
leitura, São Paulo recorda vários destes acontecimentos: a nuvem e o mar
(imagens do Espírito e da água do Batismo), o maná (imagem da Eucaristia), a
água que brotou da rocha (imagem do Cristo, de cujo lado traspassado brotou o
Espírito). Deus fora todo carinho, todo proteção, todo compaixão e paciência…
E, no entanto, Israel tantas vezes duvidou, revoltou-se, murmurou, foi de
cerviz dura e infiel!
São Paulo nos previne: “Esses fatos aconteceram para
servir de exemplo para nós, a fim de que não desejemos coisas más, como fizeram
aqueles no deserto. Não murmureis, como alguns deles murmuraram… Portanto, quem
está de pé tome cuidado para não cair”. Nós somos o povo de
Deus da Nova Aliança. Como Israel, atravessamos um longo deserto rumo à Terra
Prometida, que é a Pátria celeste; e também nós somos sujeitos a tantas
tentações, como Israel. O grande pecado do povo de Deus da Antiga Aliança era
descrer e murmurar contra Deus. De cabeça dura, Israel teimava em caminhar do
seu modo, em fazer do seu jeito, em contar com suas forças e sua lógica.
Quantas vezes o povo fez isso! Quantas vezes nós fazemos isso!
Neste santo tempo quaresmal, somos chamados a uma sincera
conversão, a mudar nossa lógica, confiando realmente no Senhor e trilhando
sinceramente seus caminhos! Estejamos atentos à seríssima advertência que o
Senhor Jesus nos faz no Evangelho. Primeiro ele usa dois acontecimentos
daqueles dias em Jerusalém para ilustrar a necessidade de conversão urgente: os
galileus que Pilatos perversamente mandara matar e misturar seu sangue com o
dos animais sacrificados no Templo – um ato de profanação! – e as dezoito
pessoas que morreram por conta do desabamento de uma torre em Jerusalém. Jesus
pergunta: “Pensais que essas pessoas eram mais pecadoras que as outras?”
Não! Os
sofrimentos da vida não são castigo pelos pecados! Mas, devem servir de
reflexão e de alerta para todos! Há uma desgraça muito pior que qualquer
acidente: morrer para Deus, ressecar o coração para o Senhor: “Se não vos converterdes, ireis morrer do mesmo modo!” Depois
Jesus ilustra o que ele quer dizer com a parábola da figueira estéril: “Há três anos venho procurando figos nesta figueira e nada
encontro!” A figueira da parábola é o povo de Israel que,
durante três anos, ouviu a pregação do Senhor e não o acolheu. Mas, e nós, há
quantos anos escutamos o Senhor? Que frutos estamos dando? Nesta Quaresma, como
vai o nosso combate espiritual, o nosso caminho de conversão?
Não abusemos da paciência de Deus, não tomemos como desculpa a
sua misericórdia para retardar nossa conversão! O Eclesiástico previne
severamente: “Não digas: ‘Pequei: o que me aconteceu?’
porque o Senhor é paciente. Não sejas tão seguro do perdão para acumular pecado
sobre pecado. Não digas: ‘Sua misericórdia é grande para perdoar meus inúmeros
pecados’, porque há nele misericórdia e cólera e sua ira pousará sobre os
pecadores. Não demores em voltar para o Senhor e não adies de um dia para o
outro, porque, de repente, a cólera do Senhor virá e no dia do castigo
perecerás” (Eclo 5,4-7)
Caríssimos, eis
o tempo de conversão, eis o dia da salvação! Deixemo-nos reconciliar com Deus
em Cristo! Convertamo-nos!
Dom Henrique Soares da Costa
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